terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

OUTRA VISÃO SOBRE O TRABALHO


Na linguagem bíblica, a idéia de trabalho está relacionada à maldição divina, como castigo decorrente do pecado original, “Ganharás o teu pão com o suor do teu rosto” (Gênesis III, 19), também se relaciona com o pensamento de que aquele que não contribui com seu trabalho não tem direitos, uma vez que, “se alguém não quiser trabalhar não coma também.” (II Tessal, 3, 8-10). É por meio de um esforço doloroso que o homem sobrevive na natureza. Mesmo assim, o homem continua totalmente dependente de Deus, “pois sem ele todo esforço não dá nenhum resultado” (Sl. 127, 1). O trabalho
realizado neste espírito sempre é recompensado por Deus “que um dia dará ao homem o descanso por seus esforços” (Apc.14,13). Então, pela Bíblia, o trabalho pode significar o sofrimento, mas também a salvação.

O trabalho e sua valorização
Durante boa parte da História, o trabalho foi visto como atividade desvalorizada, considerado, pelos gregos antigos, como a expressão da miséria humana. Para Platão (428 - 347 a.C.) e Aristóteles (384-322 a.C.), o trabalho era aquilo que estava ligado à necessidade: de alimentar-se, de cobrir-se, entre outras. Dessa forma, a necessidade limita a liberdade do homem e, assim, tudo que se destinava ao produzir e comercializar, ficava a cargo dos escravos.
Para os romanos, que também era uma sociedade escravista, o trabalho era algo vil, oposto ao lazer e às atividades intelectuais.
Durante a Idade Média (séculos V a XV), seguiu-se o referencial religioso católico do trabalho como castigo, sofrimento e penitência do homem, ou seja, dos servos, já que o nobre não deveria trabalhar, pois a sociedade estava dividida em três ordens com funções bem definidas: aos nobres cabia guerrear, ao clero orar e aos servos trabalhar.
Somente na modernidade (séculos XV ao XVIII), com mudanças profundas pela qual a sociedade europeia passou com o revigoramento comercial e urbano, que o trabalho passou a ser valorizado. Neste período, o trabalho foi idealizado como um símbolo de liberdade do homem, de transformação da natureza, das coisas e da sociedade, assumindo os anseios da burguesia nascente.
A valorização do trabalho se deu, principalmente, com a difusão das idéias renascentistas e iluministas. No Renascimento (séculos XV ao XVI), o trabalho passa a ser visto como um estímulo para o desenvolvimento dos seres humanos, e como expressão da personalidade humana ao se tornar um criador por sua atividade. Assim, é por meio do trabalho que os seres humanos preenchem suas vidas e podem realizar qualquer coisa.
Mas, foi no Iluminismo, no século XVIII, que o trabalho foi exaltado ao lado da técnica, quando o capitalismo se consolidava e surgiam as primeiras fábricas. Com os estudos de economistas e filósofos, como John Locke (1632-1704), Adam Smith (1723-1790) e David Ricardo (1779-1823), o trabalho passou a ser exaltado como fonte de toda a riqueza e valor sociais.

ATIVIDADE 1
Leia as frases de pensadores posteriores a Locke e Smith e discuta as semelhanças e diferenças sobre o conceito de trabalho apresentado até esse momento. Escreva suas conclusões e apresente-as para sala.
O trabalho positivo, isto é, nossa ação real e útil sobre o mundo exterior, constitui necessariamente a fonte inicial de toda riqueza material. (Augusto Comte [1798-1857]: filósofo francês)
Produzindo seus meios de subsistência, os homens produzem indiretamente sua própria vida material. (Karl Marx [1818-1883]: filosófo alemão)
E exatamente por meio do trabalho que o homem se torna livre, o trabalho domina a natureza: com o trabalho ele mostra que esta acima da natureza. (KierKegaard [1813-1855]: filosofo dinamarquês)

ATIVIDADE 2
Leia os documentos 3 e 4. Depois, escreva uma narrativa histórica sobre como estes pensadores entendiam o trabalho considerando a sua importância para as sociedades em que viviam.
Após análise dos documentos 3 e 4 e das frases presentes no debate, elabore uma definição de trabalho articulada com os contextos sócio-históricos de sua produção.

Documento 3
É o trabalho, portanto, que atribui a maior parte do valor à terra, sem o qual dificilmente valeria alguma coisa; e a ele que devemos a maior parte dos produtos úteis da terra, por tudo isso a palha, farelo e pão desse acre de trigo valem mais do que o produto de um acre de terra igualmente boa, mas abandonada, sendo o valor daquele o efeito do trabalho. Não e simplesmente o esforço do lavrador, a labuta do ceifador e do trilhador e o suor do padeiro que se tem de incluir no pão que comemos; o trabalho dos que amansaram os bois, extraíram e prepararam os ferros e as mos, derrubaram as árvores e prepararam a madeira empregada no arado, no moinho, no forno ou em outros utensílios quaisquer, que são em grande parte indispensáveis a esse trigo, desde que foi semente a plantar-se ate transformar-se em pão, terá de computar-se a conta do trabalho, e receber-se como efeito deste; a natureza e a terra
forneceram somente os materiais de menor valor em si. Seria estranho o catálogo dos artigos que a indústria fornece e utiliza, com relação a cada pão antes de nos chegar as mãos, se fosse possível acompanhá-los: ferro, madeira, couro, casca, tábuas, pedras, tijolos, carvão, cal, pano, tinturas, piche, alcatrão, mastros, cordas e todos os materiais que se empregam nos navios que transportam qualquer dos artigos usados pelos operários em qualquer parte do trabalho; contar todos eles seria impossível ou, pelos menos, demasiado trabalhoso. (LOCKE, Carta da tolerância [1689], 1983, p. 51).

Documento 4
O trabalho anual de cada nação constitui o fundo que originalmente lhe fornece todos os bens necessários e os confortos materiais que consome anualmente. O mencionado fundo consiste sempre na produção imediata do referido trabalho ou naquilo que com essa produção e comprado de outras nações. Conforme, portanto, essa produção ou o que com ele se compra, estiver em proporção maior ou menor em relação aos números dos que a consumirão, a nação será mais ou menos suprida de todos os bens necessários e os confortos de que tem necessidade.
Essa proporção deve em cada nação ser regulada ou determinada por duas circunstancias diferentes: primeiro, pela habilidade, destreza e bom senso com os quais seu trabalho for geralmente executado; em segundo lugar, pela proporção entre o número dos que executam trabalho útil e o dos que não executam tal trabalho. Qualquer que seja o solo, o clima ou a extensão do território de uma determinada nação, a abundancia ou a escassez do montante anual de bens de que disporá, nessa situação específica, dependera necessariamente das duas circunstâncias que acabamos de mencionar.
(SMITH, 1985 [1776], p. 35).

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